quarta-feira, 16 de março de 2011

O ABC do IFPR

Desde o meu ingresso no IFPR, em agosto de 2010, a incompreensão, a impotência e a angústia, foram os mais fiéis companheiros de trabalho. Na minha carreira profissional/acadêmica sempre valorizei a competência, o trabalho duro e a crença de que sempre podemos e devemos fazer melhor. Desde o começo tentei fazer o meu melhor aqui, mas as dificuldades foram muitas. Não sei se era simplesmente ignorado, não ouvido. Mas sei que da falta de um diálogo razoável resultou o sentimento de incompreensão.

A impotência foi constatada quase que concomitantemente. É normal as pessoas terem concepções diferentes. Calculei eu que, vendo os resultados do meu trabalho, um diálogo, em bases mais elevadas, poderia surgir. Foi quando percebi a ausência de meios e poderes para agir. Impotência. Privado do diálogo e do trabalho – elementos básicos do ser na condição humana – adveio, então, a angústia. A solidão na multidão.

De certa maneira, pode-se dizer que a campanha eleitoral começou em janeiro. A gestão, depois de um rápido concílio, já anunciava quem seria o seu candidato a reitor. E eu, ali naquela prisão insular de trabalho, não dei muito importância. Estava mais preocupado com minha angústia. Veio então uma voz insurgente, praticamente um grito sufocado. Não gosto da imagem por deveras piegas, mas esse grito reascendeu as esperanças.


Aos poucos, fui percebendo que mais pessoas estavam na mesma situação minha. A incompreensão foi desaparecendo. Havia colegas para conversar, para o diálogo. Então voltei a trabalhar e poder expressar meus pontos de vistas. Em um desses pontos de vista, apresento um ABC analisando a presente gestão do IFPR.

E já me adianto. Não é imparcial. É totalmente parcial. Afinal, a política é o campo em que a opinião engendra a ação subjetiva e, a última, tem reflexos coletivos. Quem não concordar, convido com intuito de esmiuçar ponto a ponto. A política também é arte de estabelecer consensos.



A – Autoritarismo

No autoritarismo, os superiores não ouvem os inferiores e centralizam as decisões e as informações. Os de cima determinam e os de baixo apenas executam. Brinca-se que no IFPR há os pensadores e a há os executores. O autoritarismo é sempre um movimento de anulação da individualidade dos inferiores. No fundo, sempre há uma fraqueza (moral, intelectual, técnica) dos superiores autoritários, os quais lançam mão de um poder externo para sustentar a relação de dominação. Superiores não autoritários são aqueles que conseguem a convergência voluntária e consciente dos inferiores. Os últimos não se vêem anulados, mas sim complementados, inseridos em uma lógica superior.

B – Burocracia

O IFPR está muito longe do ideal de uma organização burocrática. Weber definia a burocracia como a forma de poder em que a racionalidade (a técnica) impera e justamete por isso, ela seria a mais indicada para a gestão da coisa pública. Decisões balizadas pela racionalidade, embasadas em dados, estudos científicos são ainda um sonho no IFPR. Isso dá dimensão do nosso atraso, pois não conseguimos nem mesmo aplicar um modelo de organização que já está superado. Isso quando deveríamos nascer já como uma instituição modelo para o século XXI.

C – Comunicação

Os bancos da faculdade de jornalismo ensinaram-me que comunicar é tornar algo comum. Nas organizações, a comunicação tem dois momentos, um interno e outro externo. Para a análise interna da comunicação, ver os verbetes Transparência e Zumbidos. Externamente, o IFPR tem um deficiência grave comunicativa. Para constatar tal deficiência, precisamos simplesmente sair perguntando para as pessoas na rua quem sabe o que é o IFPR. Não vale conhecer a UFPR, UTFPR. Afinal, somos ou não a mesma coisa?

D – Democracia

A arte de criticar não é exercida em nenhuma âmbito do instituto. Definitivamente a democracia não é um sistema fácil de aplicar. Exige pessoas extremamentes conscientes, comprometidas e que respeitem a opinião alheia. Mas sem nenhuma dúvida, é ainda o melhor sistema de poder que humanidade já produziu. Alguém precisa avisar a presente gestão dessa novidade administrativa inventada por uns gregos aí.

E – Expansão

Feita de maneira desorganizada, não planejada e sem nenhum compromisso com a qualidade. Onde está a previsão de chegar a 15 campi no PDI? Mas dá para entender o sentido que a gestão vê nessa expansão. Ela atende à lógica do governo fazer estatísticas sobre a educação. E como a gestão está umbilicalmente ligada com pessoas passageiras no governo (e não necessariamente com Estado brasileiro), não questiona essas políticas, pois do contrário alguém poderia perder alguma boquinha no governo. Onde está o nosso ex-reitor? Onde estavam os candidatos a reitor antes?

F – Fisiologismo

Um dos mais graves problemas da administração pública brasileira tem um capítulo especial no IFPR. As escolhas aqui parecem ser feitas em base de relações pessoais, em interesses particulares, tudo no famoso tomacádálá.

G – Globalização

A presente gestão simplesmente parece que não vive no século XXI. O IFPR está à margem de qualquer parâmetro internacional de educação. Quantos alunos, professores, técnicos nossos estão no exterior? Quantos estrangeiros recebemos por ano?

H – Hipopotismo

O Fenômeno terminou a carreira em parte pelo problema de hipotiroidismo. Recebeu até mesmo uma maldosa alcunha de Gordômeno. Estava muito “grande” para poder executar seus movimentos com qualidade. Qualquer semelhança com o IFPR, é uma mera coincidência.

I – Incompetência

A incompetência advém como resultado da aplicação de certos valores (letras A, F, P, X) e pela ausência de outros (B, C, D, G, K, L, M, Q, T, U, V)

J – Justiça

Esse não é um valor que deve ser exclusivo do poder judiciário. A senso de justiça é um dos principais fatores que estão ligado ao bom desempenho e à motivação de funcionários. As regras devem ser claras para as punições e para as premiações. Se alguns se dão bem sem motivos claros para isso, não temos justiça e, portanto, temos um fator de desmotivação e improdutividade.

K – Know/how

A expressão inglesa traz dois dos três elementos necessários para a competência, definida como a junção dos saberes teóricos, práticos e das atitudes do indivíduo (conhecimentos, habilidades e atitudes). Nenhum deles sozinho é suficiente para termos a competência. Know/how, sem um compromisso ético por exemplo, é incompleto e pode ser tão ou mais perigoso para a vida organizacional quanto indivíduos com atitudes corretas mas com carências nos outros saberes. Pensemos: que tipo de gestão por competência temos no IFPR? Os professores ministram aulas nas suas áreas de competência, os gestores são escolhidos dentro do seus meios de atuação?

L – Liderança

É o problema mais grave da presente gestão, em todos os níveis organizacionais. O IFPR vive uma verdadeira crise generalizada de liderança, justamente em uma fase crítica de sua vida, em que a cultura organizacional ainda está em processo de consolidação. Nesse momento, as lideranças têm uma influência muito maior do que teriam em organizações já maduras. Daí a importância capital desse processo de eleição. Ainda é tempo de corrigir o rumo que o instituto tem tomado. É necessário uma mudança forte para iniciar a consolidação de uma nova cultura, da excelência do ensino, da qualidade, da competência. Ainda temos a chance de criar uma instituição do século XXI. No entanto, se o reitor eleito reforçar a cultura organizacional em voga, o IFPR estará entrando um círculo vicioso: lideranças sendo criadas dentro de uma cultura não de resultados e que posteriormente a reforçam. A cultura organizacional depois de consolidada é difícil mudança. Uma decisão errada nessa fase delicada da vida institucional irá ter graves consequências, pois poderemos perder a oportunidade histórica de criar uma instituição referência, com uma gestão do século XXI.

M – motivação

Para que motivar se é mais fácil mandar?

N – Natureza

Parece que a consciência de todos fica satisfeita somente com a criação de um curso de agroecologia. Isso seria suficiente. Todos os outros setores poderíam imprimir folhas à vontade, por exemplo. Nossos prédios (quer dizer, alguns não são bem nossos posto que alugados) tem projetos sustentáveis de reaproveitamento de água, economia energética? Que exemplos passamos para nossos alunos nessa área?

O – Organização

Bom senso é o melhor guia para a organização. Não é necessária nenhuma faculdade de administração para conhecê-la e praticâ-la. Portanto, qualquer pessoa pode dizer se o IFPR é ou não organizado.

P – Personalismo

Diz a lei que o IFPR deveria ser algo público, impessoal. Mas quando há setores que só podem ser designados pela pessoa que o ocupa, algo anda no mínimo mal. Isso sem falar na relação quase paternal (ou seria patriarcal) que muitos tem com o IFPR. Os historiadores podem dizer melhor do que eu em que período encontramos ótimos exemplos desse tipo de relação na gestão pública.

Q – Qualidade

Eis aí uma palavrinha que dá pano para manga. Mas ao contrário do que vemos no senso comum, é possível sim discutir qualidade em bases minimamente científica, sem confundir qualidade de gestão com gosto particular. Qualidade na gestão é padronização de serviços, pesquisa das melhores práticas em um setor específico (o famoso benchmarking), elaboração de índices. Na educação, qualidade quer dizer formar cidadões e profissionais críticos, participativos, competentes.

R – Rabo preso

Eu não tenho. Você tem?

S – Sucessão

Alguém acredita que com toda alta cúpula apoiando um determinado candidato, haverá as mudanças que são urgentes para o IFPR? Como falava no verbete sobre liderança, é muito difícil que um candidato lançado no seio da cúpula da atual gestão possa representar mudança. É um contrasenso, para não dizer uma ofensa a inteligência das pessoas. A atual cultura organizacional só existe porque existiram lideranças que até o momento assim a alimentaram.

T – Transparência

Ha mais coisas entre a cúpula da reitoria e o chão de fábrica dos campi que sonha nossa vã filosofia.

U – Unidade

Já havia tocado no assunto em artigo anterior nesse blog. Uma das consequências da falta de planejamento é a dispersão de ações. A falta de unidade. Só não confundamos a unidade fruto do consenso democrático com aquele imposta pela força.

V – Visão

Como fruto do autoritarismo, como falta de planejamento bem feito, nínguem sabe extamente o que somos e para onde iremos. A presente gestão carrega ainda os valores da escola técnica, raciocínia como um órgão intermediário. Não consegue pensar com a audácia que se espera de um órgão federal diretamente relacionado com o desenvolvimento de uma economia que pretende estar entre as quintas maiores em cinquenta anos. Estamos preparados para esse desafio?

W – 5W2H

Uma metodologiazinha de planejamento básica, mas que se fosse aplicada em todas atividades e ações do IFPR já faria uma diferença brutal. Trata-se de se fazer as seguintes perguntas para tudo o que formos fazer: o que? quem? O que? Como? Porque? Quando? Quanto? Ah, isso serve também ajuda na hora de escrever o lead do texto jornalístico.

X – Xenofobia

É o medo do que vem de fora, em oposição ao cosmopolitismo. Estamos mais próximos de qual dos dois extremos?

Y – Yes, sir.

Só para lembrá-los que aqui uns mandam, outros obedecem. (Confesso que não me veio à cabeça nenhum termo melhor)

Z - Zumbidos

É um modo de comunicação muito popular aqui no IFPR.

10 comentários:

  1. Luciana @LuWistubaSilva17 de março de 2011 às 17:27

    Oi, André

    Você não está sozinho...
    Estatística: estão interessados apenas nos números, a qualidade do ensino que antes era muito boa, caiu vertiginosamente...aumentou a evasão escolar.
    Promoção Pessoal...é só isso que interessa aos nossos "chefes"(líderes, infelizmente não temos.)Eu já vi isso antes: na UFPR a esmagadora maioria dos reitores só faziam gestão para sua promoção pessoal, para galgar cargos em outras esferas...pouquíssimos tinham interesse real pela instituição ou pelo o que ela representa.
    Talvez pq são professores tentando administrar uma Instituição enorme sem no entanto terem experiência ou formação para isso. As escolhas para os cargos são políticas, nunca por mérito.
    Eu luto para fazer um bom trabalho. Mas é difícil matar um leão por dia. É bom saber que tem mais gente que pensa como eu. Vc é jornalista? Sou cinegrafista.Trabalhei doze anos como cinegrafista da UFPR pela TV-UFPR. Saí de lá achando que no IFPR as coisas seriam diferentes...só mudou o endereço...tudo o que vc listou existe na UFPR. E existe no IFPR. Como mudar isso???Parece que nossas escolhas para reitor são muito restritas...

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  2. Quando querem transformar
    Dignidade em doença
    Quando querem transformar
    Inteligência em traição
    Quando querem transformar
    Estupidez em recompensa
    Quando querem transformar
    Esperança em maldição:
    É o bem contra o mal
    E você de que lado está?
    Renato Russo

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  3. Luciana @LuWistubaSilva17 de março de 2011 às 20:43

    OK...já entendi por que temos tão poucos candidatos...

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  4. Vai ai uma sugestão para a letra Y deste ABC, que inclusive é digno de uma medalha para o autor.

    " Manda quem pode, obedece quem tem juizo"

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  5. Olá Luciana,

    Sou também jornalista formado na UFSC. Trabalhei como assessor de imprensa de uma indústria farmacêutica (ELOFAR) e como repórter do grupo RIC/RECORD em Florianópolis. O passei para o cargo de Administrador no IFPR por acreditar na educação e qual foi meu susto com o que aqui encontrei. Não sou romântico e sei das dificuldade da gestão no serviço público, mas o que aqui temos está muito aquém do que ocorre em outras instituições de ensino público no Brasil. Tenho esperanças, no entanto. Fazendo nossa parte vemos que coisas já estão começando a mudar. Primeiro temos que acabar com esse medo de poder falar.

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  6. Oi, André

    São iniciativas como a sua que me fazem ter esperança novamente.Parabéns.

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  7. Olá André
    É importante colocar nossas idéias. No entanto não concordo de expor tanto a instituição em que trabalho. Concordo que estamos numa situação difícil e que precisamos mudar nossa postura. Porém devemos fazer isso dentro de casa. Por mais que não esteja havendo profissionalismo pelos integrantes do IFPR e, aqui coloco não somente dirigentes como docentes e técnicos, devemos discutir internamente e tentar acertar da melhor maneira possível. A comunidade externa precisa receber nosso serviço, nossa finalidade que é um ensino de qualidade. Garanto a você que eu e muitos outros que conheço estão trabalhando muito para que isso aconteça. Tenho uma experiência grande desde a Escola Técnica até agora e presenciei essa mudança, essa transformação. Não foi e não está sendo fácil, mas ainda somos uma criança e estamos aprendendo a andar com as próprias pernas. É preciso mudar e tenho que acreditar que essa mudança vai acontecer, pois senão não terei mais "por que" continuar batalhando para que a instituição em que trabalho seja a instituição que sonho e desejo para mim e meus colegas. Acredito que temos que falar...acabar com esse medo...conforme você colocou, mas não dessa forma. Isso não depõem contra dirigentes, depõem contra a instituição.

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  8. Olá Anônimo

    O problema é exatamente esse: falta o espaço dentro da Instituição para discutir os problemas internamente. Falta o espaço e a vontade para ouvir quais são os problemas e como resolvê-los. Historicamente, a herança do autoritarismo sempre provoca conflitos. Principalmente em uma época em que esse mesmo autoritarismo não é e não deve ser mais tolerado...Tem gente trabalhando muito para que a Instituição se desenvolva...o problema é que nosso bebê precisa se tornar adulto da noite para o dia...não há tempo para passar pelos processos de infância e adolescência...
    e definitivamente não há lugar para velhos ranços institucionais.

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  9. Apoio o André, tem que expor as barbaridades que acontecem, se não fizer isso quem está de fora acha que é tudo lindo, maravilhoso e perfeito e estaremos dando a oportuninadade aos nossos queridos "dirigentes" de fazer a sua promoção pessoal, ocupando cargos importantes nos governos estadual e federal.
    O Instituto tem muita gente boa e pode mudar, unidos podemos dar um basta nessa situação.

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  10. Prezado Anônimo,

    Alguém me fez a crítica de esse meu blog não ser o espaço adequado para discussão. Concordo plenamente. Só fiz o post aqui pela falta de espaço dentro do IFPR, recebendo ameaças veladas por estar no estágio probatório. Como tenho repetido: se nesses 7 meses eu tivesse sido ouvido, não estaria agora fazendo esse post.
    Além disso o IFPR é uma instituição pública, financiada com o dinheiro de todos. Exceto as informações sigilosas que já definidas por lei (exemplo, segurança nacional) todos os outros assuntos são públicos. Não estamos falando de uma empresas particular. Bem como não difamo, calunio ou injurio nínguem. Fazer críticas construtivas é o dever do servidor previsto no código de ética bem como denunciar todas as ações que vão contra o interesse público.

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